segunda-feira, 9 de julho de 2007

A importância do rio Itapemirim

O rio Itapemirim foi, sem dúvida, um dos elementos mais importantes dentro do contexto da ocupação e do desenvolvimento econômico do sul do Espírito Santo. Desde os primeiros tempos da colonização do Brasil, já se tinha notícia de sua existência, mas o nome Itapemirim, parece não ser o original, pois documentos datados dos séculos XVI e XVII usam os termos Tapimiri, Tepemery, Tapomeni, e Tramirim. Somente no final do século XVIII, como mostram alguns registros pesquisados se faziam referências ao rio com o nome atual. Elo de ligação entre o interior e o litoral, o rio funcionava até as primeiras décadas do século XX, como uma estrada fluvial por onde era escoada a produção de gêneros agrícolas como café, cebola, seda, algodão e também o açúcar produzido nas baixadas próximas a foz. Visando explorar esse valioso filão, o Barão de Itapemirim solicitou a Câmara Municipal, em 10 de fevereiro de 1857, permissão para edificar um trapiche na Barra, o que foi prontamente deferido pelos vereadores e para a ocupação em forma de sesmaria, da ilha da Taputera, hoje ligada ao continente pelo espigão.
Teve também o rio um papel fundamental no processo de colonização do interior sul-capixaba pelos imigrantes italianos e alemães, ao longo do século XIX. As embarcações a vapor usavam a turfa como combustível, uma composição de terra e madeira restante de antigas florestas que existiam em abundância na região do Baixo Itapemirim, diminuindo inclusive, a utilização da madeira desmatada.
O volume pluvial sempre foi um problema para a navegação no Itapemirim. O nível médio das águas só permitia o trânsito de embarcações pequenas e muitas vezes, em épocas de estiagem, nem isso era possível. Os barcos chegavam até mesmo a ficar meses encalhados. Apesar disso, o rio era fundamental como meio de transporte de mercadorias e passageiros, mesmo porque, nos períodos de chuva, os alagamentos dificultavam e atrasavam o trânsito por terra até o litoral. Assim, o Itapemirim tornava-se a via mais apropriada para que os fazendeiros pudessem fazer chegar seus produtos ao trapiche da Barra, para depois serem levados ao Rio de Janeiro pela Companhia de Navegação Espírito Santo-Campos.
A primeira concessão para a exploração do transporte pelo Itapemirim no trajeto até Cachoeiro partindo da Barra, foi feita pelo presidente da Província José Fernandes da Costa Pereira em 1862, ao Major Caetano Dias da Silva, que já em 1857 havia sido pioneiro na criação de uma companhia de vapores no Espírito Santo. Ao longo do trajeto até Cachoeiro, foram sendo implementados pontos de paradas geralmente nas margens das grandes fazendas. Da Barra até Paineiras, por exemplo, existiam os portos da Pedra, do Caxangá, do Carneiro e da Passagem, além da Areia; da Coroa da Onça; da Barra Seca e de Paineiras, próximo à ponte do Caju. Com problemas financeiros, devido ao alto custo das operações e a nem sempre garantia de rentabilidade, o Major Caetano acabou desistindo do negócio entregando-o ao governo provincial alguns anos depois.
Em 1872 uma nova cessão foi feita ao capitão Henrique Deslandes, dentista e fotógrafo paranaense que veio morar na Vila de Itapemirim após lutar na Guerra do Paraguai. Naquele mesmo ano, o capitão Deslandes solicitou à Câmara de Itapemirim autorização para explorar a navegação nos rios do Pinto, cujo canal estava sendo aberto e Muqui, a fim de atender a demanda de escoamento de café e entrada de produtos vindos da Europa, como o azeite, o bacalhau e outros artigos. Em épocas de cheias o percurso durava em média doze horas rio acima e oito horas no sentido inverso. Na estiagem essas viagens estendiam-se por até dois dias e às vezes semanas. Deslandes associou-se em 1876 a Manoel Ferreira Braga Martins, que por sua vez, recebera do Barão de Itapemirim, a posse do antigo trapiche da Barra, formando a firma Braga & Deslandes. Inauguraram o serviço com seis vapores, três de rodas e três de hélices e uma barca para passageiros. Mas, a inconstância do volume de água do Itapemirim, por diversas vezes comprometido por períodos de estiagem, tirou o estímulo do capitão Deslandes, que transferiu sua parte na sociedade para o comerciante português Simão Rodrigues Soares, em 1878. A firma passa a se chamar Braga & Soares.
O velho trapiche foi reformado, ampliado e reinaugurado em 8 de setembro de 1883, assim como o casarão dos Soares, também conhecido como Palácio das Águias. Essa firma foi até o início da década de 1930, um dos grandes responsáveis pelo fortalecimento da produção agrícola sul capixaba, pois era o principal veículo para a exportação. Todavia, nos dois últimos séculos, a ocupação humana ao longo do vale do Itapemirim e a retirada da mata ciliar de seu leito contribuíram para o seu irreversível assoreamento, comprometendo de vez a navegação. A solução para o transporte de mercadorias e passageiros veio primeiro com a Estrada de Ferro Itapemirim, que ligava Cachoeiro a Marataízes e a partir da década de 1960 com a estrada que atualmente liga os dois municípios. Mesmo assim, os negócios viriam definitivamente abaixo, com a construção da Estrada de Ferro que interligava as cidades de Vitória, Cachoeiro de Itapemirim, Campos e Rio de Janeiro. O porto fluvial de Itapemirim perdeu a importância e o trapiche foi aos poucos caindo no desuso.